Exercícios sobre os métodos de raciocínio na filosofia (com gabarito)
Os métodos de raciocínio são ferramentas fundamentais na Filosofia para analisar argumentos, construir conhecimentos e interpretar a realidade. Entre os principais métodos estudados estão a dedução, a indução, a abdução, além das falácias e dos impasses filosóficos, como a aporia. Dominar esses modos de pensar ajuda a desenvolver o pensamento crítico e a argumentação lógica.
Confira os exercícios abaixo sobre os métodos de raciocínio filosófico, acompanhados de gabarito comentado. As questões foram elaboradas com base em situações reais, trechos de textos clássicos e contemporâneos, promovendo uma aprendizagem contextualizada. Bons estudos!
Questão 1
“Mais especificamente, porém, em que consiste o procedimento por exclusão ou eliminação? Pois bem, por "exclusão" ou "eliminação" Bacon entende exatamente a exclusão ou eliminação da hipótese falsa [...].
Para ficar ainda mais claro, a propósito da pesquisa da natureza do calor, o procedimento por exclusão poderia assumir o seguinte processo de argumentação: o calor é apenas um fenômeno celeste? Não, pois também os fogos terrenos são quentes. Ele é, então, apenas um fenômeno terrestre? Não, pois o sol é quente. Todos os corpos celestes são quentes? Não, porque a lua é fria. Será que o calor depende da presença de alguma parte constitutiva no corpo quente, como poderia ser o antigo elemento chamado "fogo"? Não, pela razão de que qualquer corpo pode ser tornado quente pelo atrito. Será que depende então da composição particular dos corpos? Não, já que podem ser esquentados os corpos de qualquer composição.
E assim por diante, até se chegar a urna "primeira colheita" [...].” (REALE, 2004, p. 276).
O trecho acima expressa o método que Francis Bacon desenvolve a fim de chegar a um conhecimento verdadeiro. Esse método ficou conhecido como:
A) método dedutivo de perguntas;
B) método de indução por eliminação;
C) método aristotélico;
D) método qualitativo de avaliação;
Para Francis Bacon (1561-1626), o método indutivo desenvolvido por Aristóteles traz equívocos e possibilidades de contradição. Isso porque, ao se construir por silogismo que vão do particular ao universal, passa “muito rapidamente sobre a experiência e sobre os particulares”, elaborando uma mera enumeração de alguns fenômenos.
A fim de desenvolver um conhecimento a partir de uma metodologia mais funcional, Bacon propõe sua indução por eliminação. O objetivo desse método é investigar e analisar os fenômenos, mediante a eliminação de hipóteses que sejam falsas acerca deles, até que se possa chegar à essência do que está sendo investigado.
Questão 2
Leia o trecho de notícia e responda:
“Pesquisa mostra que 4 a cada 10 brasileiros estão endividados; preocupação com dívidas afeta saúde mental
Uma pesquisa da Federação Brasileira de Bancos, a Febraban, mostra que quatro em cada dez (39%) brasileiros estão endividados.
37% acreditam que vão quitar a dívida este ano, mas 24% dizem que vão demorar muito para pagar. A maioria dos endividados diz que a preocupação com as contas compromete a saúde.
"77% afirma que o endividamento afeta a saúde emocional, afeta as relações familiares, afeta a qualidade de vida", diz Amaury Oliva, diretor de sustentabilidade e cidadania financeira da Febraban”. (JORNAL NACIONAL. Pesquisa mostra que 4 a cada 10 brasileiros estão endividados; preocupação com dívidas afeta saúde mental, In: G1. Publicação de 26 Jul. 2025).
Considerando os tipos de raciocínios da Filosofia, pode-se dizer que o trecho acima:
A) é um raciocínio abdutivo;
B) é um raciocínio dedutivo;
C) é um raciocínio indutivo;
D) não apresenta nenhum tipo de raciocínio;
A indução é um tipo de raciocínio que parte de dados particulares para definir uma certeza geral que explique tais ocorrências particulares.
No trecho acima, temos os dados estatísticos acerca do endividamento de uma parcela da população brasileira e da relação que eles estabelecem entre dívida e saúde emocional. Tais dados derivam de entrevistas e, portanto, de noções particulares.
Ao fim, o texto traz generalizações sobre a realidade do endividamento no Brasil, trazendo uma concepção ou conclusão provável como um reflexo que serviria a toda a população brasileira (“preocupação com dívidas afeta a saúde mental”).
Questão 3
“Estas proposições, que se concluem imediatamente a partir dos primeiros princípios, são conhecidas, de um ponto de vista diferente, ora por intuição, ora por dedução, mas que os primeiros princípios se conhecem somente por intuição, e pelo contrário, as conclusões distantes só o podem ser por dedução” (DESCARTES, R. Regras para a Direção do Espírito. Lisboa: Edições 70, 1985, p. 21).
Por dedução, Descartes entende:
A) um tipo de raciocínio que tem a testagem como resultado;
B) um raciocínio que avalia os efeitos dos fenômenos no ambiente analisado;
C) uma sequência de proposições derivada de experiências particulares;
D) um encadeamento contínuo de proposições intuídas que se conclui a partir de certezas;
Para Descartes a intuição é ao ato de ver, pelo espírito, a verdade imediata das coisas. Por meio da intuição temos o conhecimento dos primeiros princípios, que são objetos simples, claros e distintos. Esses princípios são os fundamentos para a construção de uma ciência segura.
Já a dedução é uma outra forma de se chegar à verdade. Ela é um processo que permite o entendimento de conteúdos mais complexos (que não são claros e distintos), sendo ela “o que se conclui necessariamente de outras coisas conhecidas com certeza” (DESCARTES, 1985, p. 21), ou seja, dos princípios conhecidos pela intuição.
Questão 4
Leia o texto e responda:
Em uma Delegacia de Polícia
- Alguma novidade, Fagundes? - pergunta a delegada ao ver o investigador entrar correndo em sua sala.
- Sim, as câmeras de segurança do jornal registraram que o rapaz entrou no prédio por volta do meio-dia. E sabemos que seu corpo sem vida foi encontrado pouco antes das duas da tarde - relata o investigador.
- Portanto, o assassinato do jornalista ocorreu em algum momento nesse intervalo, entre as doze e as catorze horas - conclui a delegada. - E todos os suspeitos estavam no jornal nesse intervalo?
- Sim, exceto Lana, que saiu um pouco depois das onze. Podemos descartá-la?
- Lógico que sim - responde à delegada, embora continue cismada que Lana tem algo que ver com crime de seu colega jornalista. - Mais alguma informação?
- Mais nada. Mas prepare-se para a chuva de amanhã - avisa Fagundes.
- Por que diz isso? Deu na previsão?
- Nada disso. É que chove toda vez que dói o meu joelho. E ele doeu a tarde inteira…
(COTRIM, G.; FERNANDES, M. Fundamentos da Filosofia. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 92).
Marque a alternativa que apresenta a conclusão do argumento dedutivo desenvolvido no texto:
A) Lana não é suspeita do crime de assassinato;
B) Sempre que o joelho dói, chove;
C) Todos os suspeitos estavam no jornal no intervalo entre 12 e 14 horas;
D) As câmeras de segurança registraram a entrada do rapaz ao meio-dia;
O raciocínio dedutivo que está presente no texto, pode ser estruturado da seguinte forma:
Premissas 1: Todos os suspeitos do assassinato estavam no jornal no intervalo entre 12 e 14 horas;
Premissa 2: Lana saiu um pouco depois das 11 da manhã / Lana não estava no jornal entre 12 e 14 horas;
Conclusão: Lana não é suspeita do crime de assassinato.
Devemos lembrar que o método dedutivo se constrói a partir de premissas universais e que sua conclusão deriva de uma formação correta que já consta no interior de uma dessas premissas.
Questão 5
“Como pode ele estar dando aulas sobre Educação Financeira, se vive endividado?! Com certeza, essa aula é só para perdermos tempo…”.
O trecho acima traz um argumento:
A) dedutivo-hipotético, pois aponta para uma ideia coerente;
B) falacioso do tipo ad hominem, pois desqualifica a pessoa que ministra a aula;
C) indutivo, pois conclui uma ideia a partir de uma premissa particular;
D) não apresenta qualquer argumento;
O trecho acima apresenta uma falácia ad hominem. A falácia é um tipo de argumento que parece convincente, mas que traz um erro lógico na construção do raciocínio.
Entre as falácias existentes, a do tipo ad hominem age desqualificando ou atacando a outra pessoa falante.
No trecho, as proposições podem aparecer da seguinte forma:
1. Está sendo dada aula de educação financeira;
2. Ataque ad hominem: É perguntado como uma pessoa com dívidas tem capacidade de dar essa aula;
Conclusão falaciosa (a partir da desqualificação do professor): essa aula é perda de tempo.
Questão 6
"O sentimento de surpresa produzido pela percepção de uma anomalia constitui o primeiro passo do raciocínio abdutivo, considerado por Peirce como responsável pelo pensamento criativo. Sob o efeito da surpresa, que abala as expectativas produzidas por crenças bem estabelecidas, dúvidas estimulam a mente a investigar até que elas desapareçam e crenças bem estabelecidas sejam reinstaladas. Nesse processo, hipóteses explicativas são consideradas pelo organismo, as quais podem transformar a situação surpreendente em uma situação corriqueira". (GONZALES; HASELAGER, 2002, p.24).
Com base no texto, pode-se dizer que o raciocínio abdutivo:
A) se articula a partir de premissas claramente verdadeiras, numa forma de explicar de forma criativa a conclusão que se chegou;
B) parte da observação de repetições de eventos singulares, embora surpreendentes, o que os torna corriqueiros;
C) formula novas hipóteses e busca uma explicação plausível para o evento que causou surpresa;
D) não formula um conhecimento novo, pois, ao buscar transformar situações surpreendentes em algo corriqueiro, ela opera segundo crenças estabelecidas;
A abdução é um tipo de raciocínio lógico que procura explicações simples e plausíveis para uma situação inesperada.
Ao contrário da dedução, que parte de ideias universais e se aplica a fatos particulares, e da indução, que parte da observação de fatos particulares para formular uma regra geral, a abdução parte do resultado observado e formula hipóteses prováveis. Ela não opera sobre certezas, mas sobre ideias possíveis que respondem à ocorrência observada.
Questão 7
Leia o trecho e responda:
Sócrates — Ora, meu caro Eutífron, se fosse a mesma coisa ser amado dos deuses e ser piedoso, no caso de ser o piedoso amado dos deuses por ser piedoso, o amado dos deuses também seria amado dos deuses por ser amado dos deuses. Por outro lado, se a coisa amada dos deuses fosse amada dos deuses por ser amada dos deuses, o piedoso seria piedoso por ser amado dos deuses. Mas, como vês, é o contrário disso que se dá, por serem de todo diferentes entre si. Um não é objeto do amor senão por 11 b c d e 12 a ser amado, enquanto o outro só é amado por ser objeto do amor. E até parece, Eutífron, que te havendo eu pedido que me dissesses o que é em si o piedoso, não quiseste declarar-me a sua natureza, limitando-te a apontar apenas uma qualidade que lhe é própria, a de ser amado por todos os deuses. Sobre a sua verdadeira essência até agora nada disseste. Se for, portanto, do teu agrado, peço-te que não me escondas a explicação pedida e retorna ao começo para dizer qual seja a verdadeira essência do piedoso, pouco importando que o piedoso seja ou não amado pelos deuses ou que revele qualquer outra propriedade, pois não é sobre esses pontos que estamos em desacordo. Explica-me, portanto, sem maiores rodeios, o que é piedoso e o que é ímpio.
Eutífron — Em verdade, Sócrates, não sei de que maneira exponha o meu pensamento, porque todos os nossos argumentos como que giram em torno de nós mesmos, não permanecendo nenhum no lugar em que o colocamos. (PLATÃO. Eutífron, 11 a-b).
O presente trecho apresenta um tipo de argumento que:
A) resulta em uma aporia, pois Sócrates, por meio da dialética e de suas questões, conduz Eutífron a um impasse intelectual acerca do que é piedade;
B) conduz a uma demonstração clara de que “ser amado pelos deuses” é a verdadeira essência da piedade, o que valida a ideia de Eutífron;
C) constrói um raciocínio indutivo que, partindo de exemplos particulares acerca da piedade, chega a uma conclusão universal e definitiva sobre ela;
D) promove um consenso entre Sócrates e Eutífron quanto a definição de piedade, marcando o fim da discussão filosófica;
A aporia se refere a um estado de perplexidade, impasse ou dificuldade intelectual inerente a um raciocínio. É uma dúvida objetiva relativa à investigação de um problema, cujas premissas trazem contradições e dificuldade no estabelecimento de uma conclusão.
No excerto, Sócrates, por meio de seu método investigativo, desconstrói uma das tentativas de definição do conceito “piedade” proposta por Eutífron.
Eutífron, então, deixa claro o impasse em que se encontra ao afirmar não saber como expor seu pensamento, uma vez que todos os argumentos “giram em torno de nós mesmos, não permanecendo nenhum no lugar em que o colocamos”.
Continue testando seus conhecimentos com
Exercício de Filosofia para o 1º ano do Ensino Médio (com gabarito)
Exercícios de Filosofia (com respostas explicadas)
Referências Bibliográficas
ABBAGNANO, N. Dicionário de Filosofia. Tradução de Alfredo Bosi. São Paulo : Martins Fontes, 2007.
COTRIM, G.; FERNANDES, M. Fundamentos da Filosofia. São Paulo: Saraiva, 2016.
DESCARTES, R. Regras para a Direção do Espírito. Lisboa: Edições 70, 1985.
GONZALES, M. E. Q.; HASELAGER, W. F. G. “Raciocínio Abdutivo, Criatividade e Auto-Organização”. Cognitio, São Paulo, n. 3, nov. 2002
GONZALES, M. E. Q.; HASELAGER, W. F. G. “Raciocínio Abdutivo, Criatividade e Auto-Organização”. Cognitio, São Paulo, n. 3, nov. 2002, pp. 22-31.
KRUGEL, E. I. Descartes e a Fundação do Conhecimento. Dissertação de Mestrado da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Rio Grande do Sul, 2009.
MARCONDES, D. Iniciação à História da Filosofia: dos pré-socráticos a Wittgenstein. Rio de Janeiro: Zahar, 2008.
PLATÃO. Eutífron ou sobre a Piedade, In: INTERNET ARCHIVE.
REALE, G; ANTISERI, D. História da Filosofia: do humanismo a Descartes, v. 3. Tradução de Ivo Storniolo. São Paulo: Paulus, 2004.
RODRIGUES, J. K. “Notas sobre a Relação do Método e as Noções de Intuição e Dedução para o Alcance do Cogito em Descartes”. Seiscentos, Rio de Janeiro, n°4, 2024.
SAVIAN FILHO, J. Filosofia e Filosofias: existência e sentidos. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2016.
AGUENA, Anita. Exercícios sobre os métodos de raciocínio na filosofia (com gabarito). Toda Matéria, [s.d.]. Disponível em: https://www.todamateria.com.br/exercicios-sobre-os-metodos-de-raciocinio-na-filosofia-com-gabarito/. Acesso em: