Exercícios sobre a terceira geração modernista (com gabarito explicado)
A terceira geração modernista foi uma importante fase do modernismo brasileiro. Nesse período, houve a revisão crítica da proposta moderna, bem como a implementação de novas formas de se fazer literatura.
Confira a seguir os exercícios comentados sobre o tema. Teste seus conhecimentos e continue estudando.
Questão 1
Texto I
Há escritores influenciados pela música, pela pintura, pelos filósofos. Quem mais influência exerceu sobre mim, teoricamente, foi o arquiteto Le Corbusier. Quando ainda rapaz, no Recife, amigos meus, discípulos do imenso Joaquim Cardozo, me deram para ler todas as obras de Le Corbusier.
Nenhum poeta, nenhum crítico, nenhum filósofo exerceu sobre mim a influência que teve Le Corbusier. Durante muitos anos, ele significou para mim lucidez, claridade, construtivismo. Em resumo: o predomínio da inteligência sobre o instinto.
Trecho de Entrevista de João Cabral de Melo Neto. Entrevista publicada originalmente na revista Veja, 28 de junho de 1972 - Edição 199.
Texto II

Levando em conta a relação entre a proposta de Le Corbusier e a referida influência do arquiteto sobre o poeta João Cabral de Melo Neto, entende-se que a literatura cabralina, dentro da terceira geração modernista, adotou uma postura
a) voltada para a expressão do inconsciente, com ênfase na imaginação desregrada e na espontaneidade formal.
b) marcada pela valorização do sentimento popular e do lirismo folclórico em detrimento da técnica poética.
c) engajada politicamente, com uma linguagem panfletária que denuncia a opressão das elites.
d) orientada pela racionalidade estética, pela contenção formal e pela construção poética como arquitetura da linguagem.
e) centrada na subjetividade do eu lírico e na exaltação emotiva das experiências existenciais.
João Cabral de Melo Neto admirava em Le Corbusier o rigor construtivo, a lucidez e a clareza, características que ele traduziu em sua própria obra poética. Sua poesia é conhecida por um caráter anti-lírico, objetivo, cerebral e formalmente arquitetado, em contraste com o emocionalismo das gerações anteriores.
Questão 2
Noturno
O mar soprava sinos
os sinos secavam as flores
as flores eram cabeças de santos
Minha memória cheia de palavras
meus pensamentos procurando fantasmas
meus pesadelos atrasados de muitas noites
De madrugada, meus pensamentos soltos
voaram como telegramas
e nas janelas acesas toda a noite
o retrato da morta
fez esforços desesperados para fugir.
NETO, João Cabral de Melo. Noturno.
Considerando os aspectos formais e temáticos do poema é correto afirmar que o texto:
a) apresenta um lirismo contido e imagens simbólicas cuidadosamente elaboradas, refletindo o rigor formal e a racionalização da poesia característicos do modernismo de 1945.
b) se insere na vertente intimista da poesia moderna, com forte musicalidade e linguagem confessional, características marcantes do modernismo de 1922.
c) revela uma subjetividade intensa e caótica, explorando o fluxo de consciência e a espontaneidade do eu lírico, o que o aproxima da poesia de vanguarda europeia de 1914.
d) aproxima-se do concretismo de 1940 ao priorizar uma estrutura visual e a fragmentação da sintaxe, desconsiderando o conteúdo emocional e simbólico.
e) retoma traços do simbolismo de 1889, ao valorizar a musicalidade e os efeitos sonoros do verso livre, bem como temas oníricos e transcendentes.
A alternativa A é correta, pois o poema apresenta uma linguagem visual e simbólica que, embora trate de elementos subjetivos (memória, morte, fantasmas), é controlada pela razão e construída com rigor formal. Essa contenção emocional e precisão imagética são marcas da poesia de João Cabral de Melo Neto e da geração de 45, que valorizava a poesia como trabalho de linguagem, e não expressão pura do sentimento.
Questão 3
Texto I
“Escrever é procurar entender, é procurar reproduzir o irreproduzível, é sentir até o último fim o sentimento que permaneceria apenas vago e sufocador. Escrever é também abençoar uma vida que não foi abençoada“
Clarice Lispector, livro A Paixão segundo G.H.
Texto II
“Tinha que atravessar a longa rua deserta até alcançar a avenida, do fim da qual um ônibus emergiria cambaleando dentro da névoa, com as luzes da noite ainda acesas no farol. (...) Então subia, séria como uma missionária por causa dos operários no ônibus que ‘poderiam lhe dizer alguma coisa’. Aqueles homens que não eram mais rapazes. Mas também de rapazes tinha medo, medo também de meninos. Medo que lhe ‘dissessem alguma coisa’, que a olhassem muito. Na gravidade da boca fechada havia a grande súplica: respeitassem-na. Mais que isso. Como se tivesse prestado voto, era obrigada a ser venerada, e, enquanto por dentro o coração batia de medo, também ela se venerava (...) O que a poupava é que os homens não a viam. (...) Uma sombra talvez. No chão a enorme sombra de moça sem homem, cristalizável elemento incerto que fazia parte da monótona geometria das grandes cerimônias públicas. Como se lhes tivessem tocado no ombro. Eles olhavam e não a viam. Ela fazia mais sombra do que existia.”
Clarice Lispector, livro Laços de Família.
A partir da leitura dos dois excertos, infere-se que a literatura de Clarice Lispector, inserida na terceira geração modernista brasileira, caracteriza-se principalmente por:
a) denunciar de forma direta as opressões sociais sofridas pelas mulheres brasileiras, utilizando uma linguagem engajada e de forte conteúdo político.
b) abordar o cotidiano feminino com ironia e crítica social, por meio de personagens que buscam ascensão social e libertação afetiva.
c) revelar o conflito entre o desejo de invisibilidade e a necessidade de reconhecimento, por meio de uma linguagem introspectiva que transforma experiências subjetivas em reflexão existencial.
d) retratar figuras femininas estigmatizadas pela sociedade patriarcal, utilizando estruturas narrativas tradicionais que reforçam o realismo psicológico.
e) descrever cenários urbanos como pano de fundo para enredos de ação, centrados em personagens femininas que enfrentam dilemas morais com objetividade.
A alternativa correta é a letra C porque sintetiza com precisão as principais características da prosa de Clarice Lispector, marcada pela introspecção, subjetividade e pelo mergulho na consciência das personagens. Nos dois textos, observa-se a tentativa de transformar experiências íntimas e aparentemente banais em reflexão existencial, especialmente através da linguagem, vista como instrumento de compreensão e elaboração do ser.
No trecho de Laços de Família, a protagonista vive o conflito entre o desejo de passar despercebida e a necessidade de ser reconhecida e respeitada, revelando uma tensão interna própria das figuras femininas claricianas, que não se expressam por ações externas, mas por um universo psicológico denso. Essa abordagem, típica da terceira geração modernista, rompe com a linearidade narrativa e privilegia a percepção subjetiva da realidade, como indicado também no excerto de A Paixão segundo G.H., onde escrever é um ato de dar sentido à própria existência.
Questão 4
Era muito impressionável e acreditava em tudo o que existia e no que não existia também. Mas não sabia enfeitar a realidade. Para ela [Macabéa] a realidade era demais para ser acreditada. Aliás a palavra “realidade” não lhe dizia nada. Nem a mim, por Deus.
Clarice Lispector, livro A hora da estrela.
Na obra A Hora da Estrela, Clarice Lispector encena a trajetória de Macabéa, uma nordestina migrante no Rio de Janeiro. Com base no trecho acima e nos elementos centrais da obra, é correto afirmar que o romance articula
a) uma celebração lírica da pureza do povo nordestino, mostrando como Macabéa supera a miséria por meio da fé e da esperança.
b) uma crítica materialista à exclusão social, evidenciada na condição alienada de Macabéa, cuja subjetividade é moldada pela miséria e pela invisibilidade social.
c) um enredo romântico em que o sofrimento da protagonista é redimido por um final feliz, típico da literatura realista do século XIX.
d) um manifesto feminista que apresenta Macabéa como uma mulher empoderada e revolucionária, confrontando as estruturas patriarcais com ação direta.
e) uma fábula de inspiração existencialista que afasta qualquer leitura social, concentrando-se apenas nas angústias metafísicas da narradora.
A alternativa B é a correta porque A Hora da Estrela marca um momento singular na obra de Clarice Lispector ao apresentar um olhar crítico e materialista sobre a condição da pobreza e da marginalidade no Brasil urbano. A protagonista, Macabéa, é uma figura invisibilizada, cujas escolhas, afetos e limites são moldados pela carência econômica e cultural. Sua alienação é parte da crítica da autora a uma sociedade que naturaliza a miséria e apaga subjetividades. Clarice, por meio do narrador Rodrigo S.M., explicita o mal-estar de tentar representar uma vida que parece não importar socialmente.
Assim, a obra tensiona a estética clariciana com uma consciência social marcada pela denúncia das estruturas de opressão.
Questão 5
— Nonada. Tiros que o senhor ouviu foram de briga de homem não, Deus esteja. Alvejei mira em árvore, no quintal, no baixo do córrego. Por meu acerto. Todo dia isso faço, gosto; desde mal em minha mocidade. Daí, vieram me chamar. Causa dum bezerro! um bezerro branco, erroso, os olhos de nem ser ― se viu ―; e com máscara de cachorro. Me disseram; eu não quis avistar. Mesmo que, por defeito como nasceu, arrebitado de beiços, esse figurava rindo feito pessoa. Cara de gente, cara de cão! determinaram ― era o demo.
ROSA, Guimarães. Grande sertão: veredas. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.
O excerto acima exemplifica o estilo inconfundível de Guimarães Rosa, escritor associado à terceira geração modernista brasileira. Considerando o projeto literário do autor e o contexto da terceira geração modernista, o uso da linguagem nesse trecho revela:
a) uma busca por uma linguagem erudita que rejeita completamente as expressões populares, em nome da universalidade literária.
b) a tentativa de imitar fielmente o português europeu, refletindo a herança linguística da elite literária brasileira.
c) um projeto estético que funde oralidade e invenção verbal para construir uma linguagem literária singular, enraizada no sertão, mas aberta a reflexões existenciais e metafísicas.
d) uma proposta documental que busca registrar, com exatidão científica, os falares regionais do sertão mineiro.
e) o uso satírico da fala caipira como forma de inferiorizar os personagens do interior e exaltar os valores urbanos.
A alternativa C é a correta porque o estilo de Guimarães Rosa, especialmente em obras como Grande Sertão: Veredas, é marcado por uma linguagem altamente elaborada, que funde a oralidade sertaneja com neologismos e invenções poéticas. Rosa não apenas registra os falares regionais, mas recria a língua para dar conta de uma visão complexa do mundo, marcada por reflexões filosóficas, existenciais e místicas. Essa inovação linguística é uma das marcas da terceira geração modernista, que busca aprofundar os experimentos formais iniciados pelas gerações anteriores, conciliando regionalismo e universalidade.
Questão 6
Cerrava-se, grave, num cansaço e numa renúncia à curiosidade, para não passear com o pensamento. Ia. Teria vergonha de falar do peru. Talvez não devesse, não fosse direito ter por causa dele aquele doer, que põe e punge, de dó, desgosto e desengano. Mas, matarem-no, também, parecia-lhe obscuramente algum erro. Sentia-se sempre mais cansado. Mal podia com o que agora lhe mostravam, na circuntristeza: um horizonte, homens no trabalho de terraplenagem, os caminhões de cascalho, as vagas árvores, um ribeirão de águas cinzentas, o velame-do-campo apenas uma planta desbotada, o encantamento morto e sem pássaros, o ar cheio de poeira. Sua fadiga, de impedida emoção, formava um medo secreto: descobria o possível de outras adversidades, no mundo maquinal, no hostil espaço; e que entre o contentamento e a desilusão, na balança infidelíssima, quase nada medela. Abaixava a cabecinha.
[...]
GUIMARÃES, Rosa. Primeiras Estórias.
Com base na formação da palavra “circuntristeza” e no contexto em que está inserida, infere-se que o neologismo:
a) indica uma tristeza que se espalha por dentro do personagem, sem relação com o mundo ao redor.
b) sugere um sentimento de tristeza que se estende em torno do personagem, ampliado pela aridez do ambiente que o cerca.
c) representa a contradição entre tristeza e alegria vivida simultaneamente pelo personagem diante da paisagem.
d) denota uma tristeza causada exclusivamente pela lembrança do peru, evidenciando o caráter nostálgico do trecho.
e) expressa o desejo do personagem de evitar o sofrimento emocional ao observar a transformação positiva do cenário.
A palavra “circuntristeza” é um neologismo formado por prefixação: o prefixo “circun-” (que remete a algo que está em torno, que cerca) unido ao substantivo “tristeza”. No contexto, essa formação lexical remete a uma tristeza que cerca o personagem por todos os lados, ampliando-se em função do ambiente empobrecido, sem vida e mecanizado, que o rodeia. A cena mostra uma desolação sensorial e emocional, refletida na paisagem árida e desanimadora. Assim, o termo evoca uma tristeza ambiental e envolvente, mais do que apenas interna ou nostálgica.
Questão 7
As personagens que compõem esse ambiente são denominadas de acordo com os cargos políticos que exercem, ou seja, o foco está no papel social e, além disso, há um tom irônico em cada nomenclatura, a saber, Secretário do Bem-Estar Público e Privado, que menospreza as questões públicas e preocupa-se em manipular a mídia; Diretor das Classes Conservadoras Armadas e Desarmadas, no contexto de publicação da obra os ideais conservadores eram latentes e qualquer oposição era punida severamente no meio familiar ou nas ruas; a delegação americana composta pelo Delegado de Massachussetts, um suposto segurança e uma secretária, Miss Glória. O nome da mulher é relevante, haja vista que ela é a única personagem com identidade, contudo, essa identificação pode remeter a glória conquistada mundialmente pelos Estados Unidos após a Segunda Guerra Mundial.
NARRATIVA DE RESISTÊNCIA: “SEMINÁRIO DOS RATOS”, DE LYGIA FAGUNDES TELLES. (Revista Entre Parênteses). Dossiê Literatura e Resistência. Volume 6, Número 1, 2017 – ISSN 2238-4502.
O conto Seminário dos Ratos (1977), de Lygia Fagundes Telles, apresenta um conjunto de personagens com nomes baseados em seus cargos institucionais. Considerando o contexto da terceira geração modernista (1945–1980), a construção simbólica dessas personagens evidencia:
a) a adoção do realismo psicológico como forma de representar a subjetividade feminina no interior do espaço doméstico.
b) a valorização de heróis nacionais e de narrativas épicas como tentativa de reconstrução da identidade cultural brasileira.
c) o uso da alegoria e da ironia como estratégias de crítica sociopolítica, características da literatura de resistência no período da ditadura militar.
d) a busca por regionalismos e tradições populares como forma de resgatar a autenticidade do povo brasileiro diante da modernização.
e) a exaltação da liberdade individual e da autonomia política conquistada após o fim da Segunda Guerra Mundial.
A alternativa C é correta porque identifica o uso de alegoria (nomes-cargos) e ironia como estratégias centrais no conto de Lygia Fagundes Telles, que critica a opressão, a burocracia do Estado e a submissão à influência estrangeira em um contexto autoritário. Essa abordagem insere a obra no campo da literatura de resistência, característica marcante da terceira geração modernista, especialmente no período da ditadura militar brasileira.
Questão 8
A terceira geração modernista, também conhecida como Geração de 45, surgiu em um período marcado por tensões políticas, como a Guerra Fria e, mais adiante, a ditadura militar no Brasil. Nessa fase, a literatura buscou novas formas de representação da realidade, mesclando inovação formal e compromisso com questões sociais e existenciais.
Assinale a alternativa que melhor caracteriza a produção literária desse momento.
a) Reafirmação do nacionalismo ufanista e idealização do sertão como espaço de harmonia e progresso.
b) Valorização da linguagem coloquial e da oralidade como forma de preservar a cultura popular tradicional.
c) Retorno ao parnasianismo e ao uso rígido de formas fixas para expressar ideais conservadores.
d) Conciliação entre rigor formal e reflexão crítica, com abordagem de temas como alienação, autoritarismo e angústia existencial.
e) Prioridade ao regionalismo romântico, exaltando os sentimentos do eu lírico e os costumes locais.
A alternativa D está correta porque expressa com fidelidade a proposta estética e temática da terceira geração modernista. Autores como João Cabral de Melo Neto, Clarice Lispector e Guimarães Rosa representam essa conciliação entre experimentação formal (rigor na linguagem, uso de neologismos, estruturas complexas) e comprometimento crítico com temas como a condição humana, desigualdade social e repressão política. As demais alternativas contêm reducionismos ou referem-se a fases anteriores do modernismo.
Veja também: Terceira geração modernista (3.ª fase do modernismo)
Continue praticando:
Exercícios sobre a primeira geração modernista (1.ª fase do modernismo)
Exercícios sobre a segunda geração modernista
LUIS, Rodrigo. Exercícios sobre a terceira geração modernista (com gabarito explicado). Toda Matéria, [s.d.]. Disponível em: https://www.todamateria.com.br/exercicios-sobre-a-terceira-geracao-modernista-com-gabarito-explicado/. Acesso em: